Trabalhando há 15 anos com ortopedia e há 10 anos com Pilates e RPG, sempre vi a necessidade de trabalho para melhorar a propriocepção com meus clientes, sejam eles crianças, adultos, idosos, atletas, portadores de disfunção neurológica, desvios posturais ou lesões de coluna, joelho e tornozelo, entre tantas outras condições.
Os resultados desse trabalho sempre são positivos quando avaliados, bem como relatados pelos próprios clientes.
Propriocepção é a capacidade em reconhecer a localização espacial do corpo, sua posição, orientação e posição de cada parte do corpo em relação as demais.
Essa percepção permite a manutenção do equilíbrio, postura, atividade reflexa em movimentos bruscos, inesperados ou mudanças de direção de movimento e realização de atividades práticas. É um mecanismo que protege o corpo e previne lesões e compensações.
- Segundo Bear et al. (2002), propriocepção quer dizer sensação corporal, são informações de como o nosso corpo se posiciona e se move no espaço.
- Barbanti (2005), a define como o fluxo contínuo de informações sensoriais recebidas pelos receptores encontrados nos músculos, tendões, articulações e ouvido interno.
- Kunz e Kunz (1984) definem propriocepção como mecanismo de autopercepção do corpo, seu auto-retrato quando em ação.
Como a propriocepção atua no corpo
O que ocorre na propriocepção é que os fusos musculares, órgãos tendinosos de Golgi, aparelho vestibular e receptores cutâneos são os receptores que captam os estímulos integrados pelo Sistema Nervoso Central (SNC) (Schimidt e Wrisberg, 2001).
Assim oferecem as informações para que o corpo se programe em como agir a partir da informação oferecida por tais receptores.
Os órgãos tendinosos de Golgi são os receptores localizados nas junções de tendões e músculos, os fusos musculares se encontram no ventre muscular e o aparelho vestibular é um grupo de receptores encontrado no ouvido interno, responsável pela manutenção de postura e equilíbrio.
Em resumo, pode-se dizer então que a propriocepção, permite que o indivíduo estabeleça relações com o meio, fornecendo informações sobre a posição de segmentos anatômicos e do padrão do movimento, sendo este, um fator decisivo na correção gestual da estabilidade dinâmica e prevenção de lesões (Rodrigues, 2008).
Melhorar a propriocepção torna o sistema de controle motor mais eficiente e flexível para regular e controlar o movimento.
Antes do início do movimento, a propriocepção repassa as informações sobre o posicionamento do corpo e dos membros essenciais para a programação dos comandos motores. Quando iniciado, o movimento é avaliado pela propriocepção a fim de corrigir possíveis ações em relação ao objeto (Barbanti, 2005).
O que observo com a experiência clinica é que melhorar a propriocepção é de grande necessidade para o indivíduo manter uma postura correta no espaço, para que tenha consciência e imagem corporal corretas e para que evite desvios posturais e compensações de movimentos, que possam até causar uma lesão posterior.
Há algum tempo já se fala em globalidade, e que todas as estruturas do nosso corpo estão intimamente interligadas. Nosso sistema músculo esquelético, nosso sistema nervoso e todos os outros sistemas de nosso corpo, têm interligação estreita também.
Técnicas como a Reeducação Postural Global, de Philippe Souchard, Isostretching, de Bernard Redondo e o Pilates, de Joseph Pilates, assim como muitas outras, preconizam um trabalho de globalidade do corpo, sendo importante o trabalho de conscientização corporal, estabilização, centralização e flexibilidade.
Para isso, temos que estimular os todos os proprioceptores de nosso corpo, a fim de estimularmos a consciência corporal de nossos alunos.
Podemos citar como um exemplo de globalidade e como os exercícios proprioceptivos podem ajudar na consciência corporal e na melhora de toda postura, um indivíduo que realiza uma pisada pronada, que pode levar a um joelho valgo, que leva a uma compensação de uma anteversão pélvica e uma consequente hiperlordose lombar.
Essa postura também pode levar a outra compensações, como uma cifose torácica e anteriorização de ombros, elevação e tensão do músculo trapézio, o que pode até causar episódios de enxaqueca tensional. Sim!
Parece estranho que uma pisada errada possa ajudar a causar tantas compensações, mas quando começo ensinando a propriocepção ao meu aluno, seu corpo sente a necessidade de se alinhar no espaço, conforme a correção de sua pisada.
Assim ele desenvolve uma maior consciência corporal de como se posicionar, pois o corpo necessita de compensações, agora corretas, para andar corretamente, e para manter-se em pé corretamente.
Mais um exemplo, e muito observado em clínica, é a ocorrência de descarga de peso maior de um lado do corpo. Se faço a descarga de peso maior em um membro inferior do que do outro, levo a uma sobrecarga daquele lado, causando muitas vezes tendinites, escolioses e até pinçamentos nervosos.
É de grande importância mostrar ao meu aluno que a descarga de peso deve ser bilateral, simétrica. A descarga de peso assimétrica pode ser um hábito da pessoa, pode ser causado por lesões mal recuperadas ou até ocasionado por algum desvio congênito de coluna.
Muitas vezes o aluno que realiza essa descarga de peso, não tem a consciência corporal que a realiza assim. Cabe a nós, profissionais, ensiná-lo a despertar essa consciência corporal no aluno e treiná-lo, e isso pode ser feito através dos exercícios proprioceptivos.
Benefícios dos exercícios para melhorar a propriocepção
Os exercícios para melhorar a propriocepção auxiliam quem pratica a se recuperar muscularmente, pelo fortalecimento e manutenção da condição de sustentação e movimento corporal (Sarkis, 2009).
Os benefícios dos exercícios proprioceptivos são muitos, sendo os principais a melhora e desenvolvimento da consciência corporal, melhora da postura, melhora do equilíbrio, prevenção e reabilitação de lesões.
A propriocepção começa na infância e dura a vida toda, portanto deve ser estimulada desde que a criança fica em pé. Um ótimo estímulo para crianças é andarem descalças, assim seus receptores são estimulados e seu corpo “aprende” como se portar com diferentes estímulos.
Atletas, principalmente os que correm, referem dores muitas vezes em músculo tibial anterior, tendão de aquiles, tendão patelar ou até sobrecargas articulares pela falta de estímulos proprioceptivos.
Na minha prática clínica, nossos alunos, após 2 a 4 semanas de exercícios proprioceptivos, relataram uma melhora de cerca de 80 a 100% dos incômodos quando praticavam corrida.
Os estímulos proprioceptivos também devem ser realizados em idosos pois estes necessitam de estímulos para manutenção de equilíbrio, principalmente, para a prevenção de quedas.
A lentificação geral do processamento das informações sensoriais, associada à diminuição da condução nervosa, comuns no processo de envelhecimento, contribuem para o retardo das respostas posturais automáticas, justificando a necessidade dos exercícios proprioceptivos em idosos.
Em pacientes com desvios posturais e patologias da coluna, como hérnia de disco, realizamos, em nossa clínica, semanalmente, exercícios para melhorar a propriocepção e o trabalho ajudou em muito a melhora da postura, do alinhamento corporal e consequentemente de dores.
Além disso, o trabalho para melhorar a propriocepção exige, pela resposta de correção postural e uma ativação do core ou powerhouse (centro de força), para que a pessoa se mantenha equilibrada nos exercícios, sendo mais um ponto positivo para a postura.
Exercícios para propriocepção
Alguns tipos de exercícios proprioceptivos encontrados na literatura são os exercícios de equilíbrio, exercícios com apoio unipodal, com ou sem auxílio da visão, exercícios em base instável, exercícios de deslocamento, exercícios que estimulam a mudança de direção e exercícios que estimulam gestos esportivos.
Os exercícios propostos aqui tem como objetivo dar ênfase à propriocepção nos exercícios de Pilates, porém, sabemos que todos os exercícios de Pilates já melhoram a propriocepção em nossos alunos, por serem exercícios que trabalham consciência corporal, fluidez e ritmo de movimento e postura.
Utilizaremos a Cadeira Combo, o Reformer e o Airmat, (equipamento da Suspensus, idealizado pela Vanessa Alves) para a realização dos exercícios sugeridos.
#1 – Chair
Na Chair, os exercícios Going Up and Front (Subindo de Frente) e Going Up and Side (Subindo de Lado) com disco de rotação podem ser ótimos estímulos proprioceptivos, além de serem exercícios de fortalecimento de músculos da coxa e glúteo.
O apoio do pé sobre o disco deve ser em primeiro e quinto metatarso e calcâneo e o peso do pé deve ser distribuído por igual em cima do disco.
Lembre-se sempre que a força deve ser realizada em membros inferiores, e o aluno deve sempre estar com o corpo em crescimento axial, sem inclinar o corpo para frente.
Acrescentar molas facilita o exercício e realizá-lo sem o apoio das mãos dificulta.
#2 – Reformer
No Reformer, as variações de Side Splits (Separador de Lado) são ótimos estímulos proprioceptivos. A mola estabiliza, “segura” o movimento, e também pode resistir o movimento.
No caso desse exercício, a ideia não é resistência, então quanto menos mola, menos estabilização e mais difícil o exercício.
Outro facilitador é deixar algum apoio ao lado do Reformer para que o aluno segure ao realizar o exercício ou pode-se dar um bastão, que apoie no carrinho do Reformer para se sentir mais estável.
Fique sempre ao lado do aluno para ajudar em alguma instabilidade ou dificuldade que possa ter.
#3 – AirMat
A terceira série de exercícios propostos é realizada no Airmat, equipamento da Suspensus, método desenvolvido pela Vanessa Alves.
O equipamento é composto por uma plataforma de metal suspensa por cordas e uma estrutura de metal que segura essas cordas.
O aluno fica em pé na plataforma e realiza agachamento, agachamento com V position, flexão plantar, e avanço. Para dificultar, pode-se realizar exercícios de apoio unipodal também.
Os facilitadores para esses exercícios são deixar que o aluno segure nas bases de ferro ou nas cordas para realizar os exercícios, abrir os membros superiores, estabilizar a plataforma para que tenha o mínimo movimento.
Modificações dificultadores podem ser diminuir a base de sustentação, apoio unipodal, não segurar em qualquer lugar e até provocar um movimento maior da plataforma.
Com isso concluímos nossa matéria e espero ter contribuído para a prática clínica profissional. Espero que possamos trocar muitas experiências!
Referências bibliográficas:
BARBANTI, Valdir J. Formação de esportistas. Barueri, SP: Manole, 2005.
BEAR, Mark F., CONNORS, Barry W., PARADISO, Michael A. Neurociências: desvendando o sistema nervoso. 2ed. Porto Alegre, RS: Artmed,2002.
KUNZ, Kevin, KUNZ, Bárbara. Reflexologia. São Paulo, SP: Manole, 2001
SARKIS, Miguel. A construção do corredor: dos primeiros passos à alta performance. São Paulo, SP: Ed Gente, 2009.
SHIMIDT, R & WRISBERG, C.A. Aprendizagem e performance motora – uma abordagem de aprendizagem baseada no problema. 2ed. Porto Alegre, RS: Artmed.
RODRIGUES, B.B; DIEFENTHAELER, F. O envolvimento do tecido neural nos entorses de tornozelo. Brasilian Journal of biomotricity. V 2. No3. Pag 145 – 154, 2008.