Nos últimos anos é evidente o crescimento no número de gestantes que chegam em nossos consultórios à procura de exercícios que favoreçam a melhora na qualidade de vida durante a gestação.
Outras ainda, mais empoderadas sobre o assunto, procuram por nosso trabalho buscando proporcionar melhores condições físicas para um parto mais adequado e sem complicações futuras.
Para que nós, profissionais que atuam com o Método Pilates possamos atender a estas necessidades, é necessário que estejamos preparados para as surpresas e desafios que o ciclo gestacional pode nos trazer.
Vamos lá?
Mudanças no Período Gestacional
A gravidez é um período de grandes modificações físicas, psicológicas e sociais (incluindo a sexualidade) para a mulher e cada uma vivencia esse processo conforme sua condição física, cultural e social1.
O corpo gravídico sofre vários ajustes fisiológicos e anatômicos que acarretam várias mudanças no organismo da mulher. Em uma gestação sem complicações, o organismo passará por alterações físicas e psíquicas, às quais a gestante poderá contar com ferramentas (terapias e/ou exercício físico) para se adaptar às mesmas ou amenizá-las.
Entre as mais comuns, destacam-se alterações:
- Hemodinâmicas
- Hormonais
- Cardiopulmonares
- Musculoesqueléticas
- Urinárias
- Digestórias
- Psíquicas
As alterações musculoesqueléticas, estando entre as mais comuns, são as alterações que iremos enfatizar neste artigo, sendo caracterizada por mudanças significativas no equilíbrio corporal, que começam a ser observadas a partir do segundo trimestre gestacional podendo perdurar algumas semanas após o parto.
Estas alterações podem gerar sérios acidentes, como as quedas que podem ocorrer na ordem de ¼ das gestações.
Como consequência, são evidentes na realização da marcha mudanças significativas na cinética e cinemática nos membros inferiores, decorrentes das modificações na distribuição de massa (aumentos na flexão, extensão, adução e abdução do quadril, flexão e extensão do joelho e dorsiflexão de tornozelo, além de aumento no tempo de apoio duplo, diminuição no tempo de apoio simples e aumento nas variáveis cinéticas com o avançar da gestação).
Outra alteração que merece atenção é quanto ao alinhamento corporal, modificado durante a gestação como uma forma de adaptar-se ao crescimento uterino, onde comumente há um aumento na lordose lombar.
É importante salientar que esta mudança de centro de massa é um dos fatores causais das frequentes lombalgias gestacionais, que são as queixas mais comuns entre gestantes (cerca de 50%), podendo comprometer sua qualidade de vida4,5.
Exercício Físico na Gestação
A prática de exercício físico durante o ciclo gestacional contribui para a prevenção, redução e melhora de várias destas alterações supracitadas, entre outras, como:
- Retenção de Líquidos
- Stress Cardiovascular
- Capacidade de Oxigenação
- Pressão Sanguínea
- Risco de Diabetes Gestacional
- Tromboses e Veias Varicosas
- Controle do Peso Gestacional
Além destes, não podemos deixar de falar da influência positiva do exercício no sistema urogenital, na prevenção de incontinência urinária durante a gestação e depois do parto. Um estudo realizado em uma Universidade do Sergipe apontou que os sintomas miccionais provocaram um impacto negativo na qualidade de vida das gestantes, com piora da percepção geral de saúde e da incontinência urinária ao final da gestação9.
Um programa de exercícios bem assistidos por um profissional capacitado pode amenizar o desconforto e as possíveis lesões neste período. O exercício físico é uma intervenção que pode apresentar bons resultados, sendo reconhecido como benéfico em todas as faixas etárias da mulher.
Em idade fértil, ela deve ser motivada a manter uma vida ativa e, ao engravidar, permanecer ativa, pois não há na literatura evidências de que o exercício físico seja prejudicial para mãe ou feto. Pelo contrário, o exercício físico pode ser um fator protetor contra um grave problema de saúde pública: a prematuridade – responsável pela mortalidade no primeiro ano de vida, e morbidades que podem se manifestar ao longo do ciclo vital da criança.
Há evidências de que pouco tempo de exercício já resultaria em uma espécie de proteção contra a prematuridade, o que facilitaria a disseminação e a adesão a um programa de exercícios a ser proposto durante o pré-natal e que buscasse, principalmente, uma mudança no estilo de vida6.
Outra questão importante é com relação às condições materno-infantis, onde as prevalências de cesárea e de natimorto foram menores para as mulheres que praticavam exercício físico na gestação.
Sendo o Brasil um país com altas taxas de nascimentos por cesárea (cerca de 60% em 2014) e, sendo esta considerada uma via de parto de risco quando não indicada, seria significante oferecer às gestantes alguma intervenção, neste caso, a prática de Pilates na busca da diminuição destes índices.
Estas informações são altamente relevantes para os indicadores sociais na saúde pública, onde ficam nítidos os benefícios do exercício físico na gestação tanto para a saúde materna quanto para a do feto10,11.
O exercício físico tem papel atuante na promoção da saúde, qualidade de vida, prevenção e controle de várias doenças, visto que o mesmo proporciona melhora das capacidades funcionais da gestante e gera qualidade de vida para a mulher da gestação ao pós-parto.
Os exercícios físicos propostos no método Pilates têm se demonstrado capazes de contribuir para o alívio dos desconfortos gestacionais, bem como auxílio a uma parturição mais saudável12.
Método Pilates e Atenção à Saúde da Gestante
Desenvolvido pelo alemão Joseph Hubertus Pilates, o método propõe um trabalho muscular tanto do assoalho pélvico (AP) – podendo ser eficaz na proposta de prevenção das disfunções do mesmo, principalmente através do fortalecimento, quanto da estabilização e controle global.
O mesmo consiste em exercícios físicos que utilizam recursos como a gravidade e a resistência buscando a filosofia do bem estar. Seus princípios básicos são a concentração, o controle, a centralização, a respiração, a leveza e a precisão, resultando em ganho de força e relaxamento13,14.
O estímulo proprioceptivo do Powerhouse (centro de força) e a repetição dos movimentos corretos facilitam a aprendizagem motora que levam o praticante a alcançar um padrão de treinamento com melhor desempenho motor e menor risco de lesões, além da sensação de bem estar que o método pode proporcionar7-15.
O Pilates pode ajudar na promoção da saúde e trazer sentimentos positivos de prazer e satisfação à mulher no ciclo gravídico-puerperal, reduzindo a ansiedade e depressão pós-parto, uma vez que o exercício físico ajuda a tornar a mulher mais autoconfiante e satisfeita com sua aparência, elevando sua autoestima 7-14.
Propor um programa de exercícios de forma segura e eficaz pode preparar a gestante tanto fisiologicamente quanto psicologicamente para concluir a gravidez com sucesso. Fortalecer a musculatura necessária pode auxiliá-la na fase do crescimento uterino, prevenindo dores e desconfortos posturais podendo promover a qualidade de vida durante o ciclo gravídico16.
Além disso, os exercícios do método Pilates constam de respirações diafragmáticas que, além de causar relaxamento podem auxiliar no processo do trabalho de parto12.
Com todos estes benefícios, a prática do Pilates pode se tornar uma estratégia para promover a saúde da gestante, abrangendo um dos campos de ação da promoção da saúde, principalmente no que diz respeito à mudança do estilo de vida.
Tratando-se especificamente do método proposto por Joseph Pilates, Kroetz12 demonstrou que o mesmo é um recurso seguro, que trabalha o corpo da gestante conforme suas necessidades, sendo composto por exercícios adaptáveis ao grau de dificuldade, a serem evoluídos de acordo com o desenvolvimento gestacional.
O mesmo estudo verificou que o método através de seus princípios que devem ser empregados durante a realização dos exercícios, traz inúmeros benefícios para a gestante atuando não só nas alterações musculoesqueléticas, respiratórias e circulatórias, mas também nas alterações de autoestima.
Pilates e Melhora nas Condições Físicas da Gestante
Um estudo realizado por mim durante o meu mestrado, aplicou o método Pilates em cinco gestantes do segundo trimestre ao pós-parto imediato. Dentro dos sete primeiros dias de pós-parto, elas foram entrevistadas individualmente acerca de suas percepções sobre a prática do método durante a gestação, parto e pós-parto.
Ao serem questionadas sobre os benefícios do método, todas as participantes relataram algum tipo de melhora nas condições físicas, dentre elas, as que mais se destacaram foram:
- Melhora da Capacidade Respiratória (menos dispneia ao esforço)
- Melhora da Capacidade Muscular (diminuição de câimbras e da fadiga muscular e melhora do equilíbrio)
- Melhora da Postura (diminuição de dores na coluna)
- Melhora da Flexibilidade (relaxamento)
- Parto e Pós-Parto com boa recuperação
Durante a gestação, a postura da gestante fica prejudicada devido o ganho gradativo de peso, podendo causar um desalinhamento corporal e, consequentemente, dores lombares.
O Pilates, além de auxiliar nesta questão da manutenção da postura e alinhamento, ajuda a manter o assoalho pélvico forte, o controle do equilíbrio e consciência corporal, modificados devido à alteração do centro de gravidade12.
Segundo Endacott17 para se alcançar uma estrutura muscular adequada para a sustentação da postura, é necessário o fortalecimento do centro de força, tão enfatizado por Joseph na criação de seu método.
Ele acreditava que a partir de um fortalecimento adequado da musculatura do tronco e pelve, todos os outros segmentos do corpo estariam sustentados e não realizariam compensações ao movimento18.
Isto explica o conforto causado nas gestantes após a prática dos exercícios, onde algumas citaram a percepção de melhora da postura, da marcha e das atividades de vida diária.
Além destes benefícios, algumas relataram melhora da qualidade do sono, que pode estar relacionada tanto com os benefícios físicos de relaxamento da musculatura causado pelos alongamentos, quanto com o relaxamento mental que a própria respiração do método durante a prática dos exercícios pode causar por se tratar de uma respiração diafragmática lenta e consciente, semelhante à respiração utilizada por algumas técnicas de meditação8-19,20.
Dixhoorn21 e Rakel22 citam que tal benefício pode dar-se pelos efeitos fisiológicos que a respiração diafragmática causa no organismo, como:
- Estabilização do Sistema Nervoso Autonômico
- Aumento da Variabilidade da Frequência Cardíaca
- Diminuição da Pressão Arterial
- Aumento da Função Pulmonar
- Aumento da Função Imune
- Aumento do Fluxo de Sangue e Linfa
- Melhora da Digestão
- Melhora da Qualidade e Padrão do Sono
- Aumento do Bem-Estar Biopsicossocial
- Qualidade de Vida
Benefícios do Pilates na Parturição e Pós-Parto
Uma das hipóteses para a contribuição do Pilates ao parto normal/natural pode se dar pelo controle respiratório que ele condiciona ao praticante. Kroetz12 afirma que uma respiração diafragmática adequada e bem assistida durante a prática do Pilates é fator primordial à preparação da gestante ao parto natural.
Da mesma forma, Böing23 concluiu em sua pesquisa que a técnica respiratória, além de interferir no parto como fator relaxante, diminui a sensação dolorosa, principalmente se for realizada de forma lenta e profunda, se tornando uma alternativa potencial para o controle da dor durante o trabalho de parto.
Nos meses finais da gestação o Pilates tem por finalidade ajudar a gestante a obter ganho de força em membros superiores e inferiores tanto para uma boa recuperação do trabalho de parto quanto para futuros cuidados com o bebê, já que a amamentação e o suporte do peso do bebê no colo exigem esse preparo12.
Segundo Surita24, independentemente do tipo de parto, o exercício físico sempre vai oferecer ganhos para a gestante, tanto no pós-parto imediato quanto no puerpério.
A percepção positiva das participantes deste estudo sugere uma mudança na atenção à saúde da mulher gestante por parte da sociedade e dos profissionais de saúde, com o objetivo de incentivá-las à prática do método Pilates durante o período gestacional.
Tudo isso possibilitando-as conviver com alterações múltiplas que este período provoca em seu cotidiano com mais qualidade de vida e consequentemente promovendo a saúde das mesmas já que estas alterações podem causar algum dano à saúde física, social e psicológica durante e após a gestação.
Quanto ao acesso à prática do método proposto, sugere-se aos gestores municipais, estaduais e federais a oferta para a prática do Pilates nos setores públicos de saúde, já que o método atende às propostas de promoção da saúde da mulher gestante e puérpera feitas pelos programas e políticas públicas já existentes no país.